Retirou a maré submersa... um tempo... um cais demorado.,. um pão ázimo... no tempo da memória a ilha mingou.
Maria sabia que as férias estavam a chegar, subia as escadas do sótão num ar de ciclone, aprontava o saco de viagens... voavam pelo ar todas as coisas e mais a vontade daquelas férias, de permeio a ideia de se ausentar.
Sentou-se na cama da colcha de farrapos, que já tinha ido a S. Jorge no Terra Alta e chegado ao Porto de Pipas com um rato l á dentro... "rato com pretensões a turista".
Num sobressalto ergueu-se, tinha de levar aquele livro de histórias, e ainda a melhor maneira de o fisgar à irmã...
Arre! Aquele buraco no chão era um desatino, a mãe já lá tinha enfiado uma perna, ficando com ela a abanar no corredor, o que por certo não lhe aconteceria, dadas as suas frequentes viagens àquele lugar de garrafas, cestas, caixas e uma cama (sempre vinha um. parente de algum lado).
Ainda havia mais um, dia de aulas, depois partiria.
Era um desassossego... depois Rafa não estava lá, deixara-lhe um tempo vazio povoado de fantasmas... Parou a mala a meio do sótão, e num sonho acordado de tristeza ressequida, chorou todas as lágrimas da saudade.
Às vezes embrulhava-se toda em ondas de recordar e lá ia por todos os caminhos que tinha percorrido num velho "Volks", velho e verde. Tudo tinha sido verde entre eles e as palavras que vinham do espaço de sentir.
Caminhos velhos que ela queria recordar para acreditar, mas que no fundo nunca mais voltariam, vivia entre eles e pelo meio o canal das palavras que se sentiam e não se diziam, ficando sempre por dizer.
Rafa tinha partido num barco cheio de fardas e boinas, revoltas e medos... atravessaram o Oceano cartas que escrevia à luz mortiça do quarto, era o tempo de se encontrarem, aliviava-lhe aquela ausência... mandava-lhe palavras feitas sorrisos em envelopes de janela, com abraços escondidos pelo meio das reticências.
Maria odiava aquela guerra.
Levantou-se, saco de viagem na mão, cheio de coisas e duas cartas... O mar era um turbilhão de azul e paz, as pernas ainda mareando, acampou no cais do Pico.
Os homens carregavam sacas cheias de cracas, e as mulheres coziam pão redondo, achatado, com sabor a milho e tocavam viola da terra noite a dentro.
Já não podia mais!
Tinham passado semanas.
Manhã cedo juntou os cacos, fez um lugar na Espalamaca, até ao Faial.
Meteu-se no Espírito Santo... rumou à ilha dos bravos, às suas coisas.
Com a força de todos os ventos que não tinham eco em lugar nenhum, voltou para o sótão.
Com as lembranças, dormiu muitas noites na sua cama da colcha de farrapos, esperou, e deitou-se e acordou com aquela espera... perdida por fora, sábia por dentro.
E vivia quase como um canário, que haviam fechado na gaiola e pendurado num arame da trave mestra e que nem o chiar da rolha no vidro da garrafa animava.
Pássaro sem nome.
Rafa voltou e riram e pintaram numa tela de esperança um verde novo, durou pouco aquela tinta, pintada à pressa com medo de acabar.
Mais folhas tombaram do calendário e ele partiu. Maria voltou a esperar que o tempo se cumprisse.
No peito onde o guardara, cresceram nós, ganchos, âncoras...
...Joaquim, o carteiro abanava o corpo num andar marítimo...
..."E não há nada menina... para a próxima!...
Rafa viera e partira, correndo a vida rápida entre o amanhecer e uma lágrima que doía pelo espaço que havia para sorrir.
MIZÉ, seja muito bem-vinda!
ResponderEliminarMeu caminho encontrei
Nas rimas do dia-a-dia
E com gosto eu rimei
E rimo com a cantoria
Que na ilha encetei
Ao gosto da melodia.
Cara Mizé, Terceirense,
Amiga de coração,
Esta rima te pertence
Faz dela o teu quinhão;
Porque nesta ilha vence
Quem canta com emoção.
Brilham estrelas no céu,
Brilha a lua abençoada,
Canta ao povo ilhéu
A bendita Madrugada
E sob um brilhante véu
Canta a ilha encantada.
O Entrudo quando vier,
E está no rumo certo,
Hei-de tentar descrever
O que ouvir mais de perto
Mesmo que não possa ver
No bom trio já me acerto.
Rádio Horizonte Açores,
E Azores Global,
Na Praia também há cores
Para dar ao pessoal
Que vive sentindo amores
Pelo nosso Carnaval.
Agora na despedida
Não lhe vou dizer adeus
Tenho fé que de seguida
Virá ler os versos meus
Que lhe dou agradecida
Por todos os versos seus.
Abraço terceirense
Rosa Silva ("Azoriana")
Zézinha,
ResponderEliminarDepois deste tempo todo, não fiquei surpreendida pela forma como te expressas, uma vez já conhecia a tua veia poética.
Estes pequenos excertos da tua e já longa experiência de vivência quer na prosa, quer na poesia, releva a tua personalidade e sensibilidade que tens perante a vida.
Como sempre, e aqui mais uma vez, fica demonstrado o teu apego intenso à infância... e a alma de poeta.
Nunca desistas! O caminho é por aí!
Um beijo
Alice