21 de fevereiro de 2010

Desculpas de Março


       Amor, são milhões de pequenos instantes e gestos que se juntam para construir algo tangível...

       (a Maria das Dores Ávila Barcelos)

        Os dias caminham apressados para Março e lembrei-me que estavas à minha espera, com o teu doce de figos, luzidio, brilhante, dentro dos frascos... mas não cheguei a tempo...
       Dos figos, lembro o teu sorriso.
       A ave que habita dentro de mim, não poderia ter adoptado melhor “mãe”, (ainda quero acreditar que no céu se pode ler).
       São só desculpas de Março...
       “Mizé Capelo Gaivota”


cantododesconhecido.blogspot.com

20 de fevereiro de 2010

Palavras para contar

pelo que despertam em mim as crianças

Saltitão ou coelho,
           Ou
Coelho Saltitão


O coelho saltitão
Saltava ali pelo chão,
Pelo prado, pelo serrado,
Era um coelho dourado
Dourado e espertalhão,
O coelho saltitão,
Saltava e procurava
Uma cenoura alaranjada,
Que já na horta espreitava,
Com uma rama folharuda
Verdinha, clara e escura,
E debaixo dessa rama
Quase, quase a despontar,
O que o coelho queria
Era um saboroso jantar!
Nem pensava na raposa,
Que de rabo “pelachão”,
Gostaria de trincar
Um coelho saltitão,
Apanhou a tal cenoura
E do jantar fez manjar,
Comido como um festim,
E assim vai acabar
O que pelo jantar se finar
Fez desta história,
O seu fim!

18 de fevereiro de 2010

D. Óscar, "O muitas vidas”

(O gato que é meu vizinho)

Mia o gato, mia, mia,
O gato das suas donas,
Encontrado por acaso,
"Todo roto”, esfarrapado,
E com ternura adoptado,
Passaram dias e meses,
E atrás destes anos sem fim,
Mia o gato, mia, mia,
Nunca vi um gato assim!
Come patê e puré,
Carne picada e assada,
Faltam-lhe metade dos dentes,
Que maçada, que maçada!
Tem uma cama vermelha
Forrada a manta lavada,
Cheirosa e perfumada,
Tem guizinhos e pompons,
E uma bola de brinquedo
Dorme sonecas à tarde,
No quentinho e no sossego.
Mas mesmo assim já velhote
Não se fica pela casa,
Pela noite vai á rua
E mia às gatas á lua,
Não lhe sabemos idade,
Tem muitos, bem à vontade.
Mas nós gostamos de vê-lo
Deambulando por noite,
Nas suas vindas e idas,
Este gato “alaricado”,
O Óscar das sete vidas!

14 de fevereiro de 2010

Coisas que dão sol ao dia


       “Coisas de Poetas...
       Olá, Querida Zé,
      Talvez bem poucos, como tu, me conheçam tão bem quer literáriamente (existirá este termo?), quer humanamente, e o inverso também é verdadeiro. Se, realmente, existem "almas gémeas" acho que nós o seremos.
       Este pensamento é bem visível no teu comentário...”

       Do meu amigo jornalista, escritor, poeta, homem dos mil ofícios, deixo aqui hoje para aqueles que gostam de saborear o sabor que nem todas as palavras têm, este “endereço”, acreditem que vale a pena, garanto-vos, que isto de palavras com sabor ainda vou percebendo um pouco...

10 de fevereiro de 2010

Segredos de “pé-de-orelha”

À minha avó Maria que me ensinou que o segredo pé-de-orelha era o que se dizia baixinho ao ouvido, e jamais se repetia.

Ao ouvido em surdina
Sussurrado, murmurando
Diz-se segredos, “mexericos”
Bem baixinho, segredando,
Vão dizendo: guarda, guarda!
Não contes nada a ninguém,
Se o contares fico triste
Mesmo que contes a alguém,
Alguém não é qualquer um
É pessoa especial,
Mesmo assim, vá lá, não contes
Deixa lá que não faz mal,
Um segredo que é segredo,
É um segredo guardado,
No coração bem fechado
Sem fechadura nem chave,
Só entende lealdade,
É que um sussurro murmurado
Ao pé-de-orelha escutado,
Vai-se o segredo levando
E assim fica comprovado,
Que um segredo murmurado,
Em pé-de-orelha escutado,
Não é segredo guardado,
Não vale cruzes na boca
Nem fazer figas com os dedos,
Tudo se evapora no ar,
Pra quem não guarda segredos,
Chega um de cá, um de lá
Um alguém, outro que vem
E o murmúrio murmurado
O segredo bem guardado
Já foi pelo vento levado!

9 de fevereiro de 2010

Bichinho Geográfico

       (O porquê da lengalenga do bicho-de-conta)
      
       Bicho de conta, sou eu, escondendo o lado do avesso, enrolando o lado de fora.
       E desta conta que sou, abro frinchas pra que saiam , passos, contos, histórias doces, enternurando a voz, quando é a vez de contar. Verbalizando-as, são únicas, de um tempo que terá sempre o seu tempo, um tempo para ensolarar.
       Seu nome de Nicolau, Saraiva nem sei porquê! Era um bichinho-de-conta, andava sempre a enrolar.
       Sua mãe era Dona Conta, Dona Conta de Contar.
       Brilhante, luzidio, este bichinho cinzento, que sabia rebolar era feito em “dobradiças” assim pela mãe natureza, mas com perfeição tamanha que dir-se-ia, que ao ter medo e ao enrolar-se até parecia façanha. E era assim tal e qual. Igual não conhecia, e de bichos e bicharocos, conhecia eu a rodos.
       Mas deste bichinho de conta começo-vos agora a contar:
       Certo dia, num daqueles em que brilha o sol no céu, apetece manga curta, uns calções e perna ao léu, havia eu de descobrir para meu perfeito pasmar, que um bicho que é de conta, não é só bicho de contar.
       Maria que era das Dores, Dorzinhas chamava-a eu, veio a correr, coradinha, esbaforida, cabelo curto, ondinhas largas, como as do mar espraiadas, pequenita, olhos azuis, azuis como dois lagos, ou como a cor da estrada estrelada, em que os anjos se passeiam, sem se importar com mais nada.
       Tinha lá, isso tinha, um arzinho angelical, mas combinando comigo, dava uma mistura infernal.
       Olhando-me diz-me ela, num jeito que espevita a curiosidade, aguçando-me os sentidos, numa autêntica delícia: Se soubesses o que encontrei ao fundo do meu quintal, mesmo junto à capoeira, (paredes meias com a parada da polícia que tinha o quartel ao lado e que em golfadas de água por garrafa de pirolitos, era o nosso perfeito alvo) e continuando diz-me ela: Está lá um bicho de conta, um bicho de conta danado!
       Danado, disse eu!
       Ele só sabe enrolar-se, não faz muito mais do que isso!
       Ai! Estás tu muito enganada, fiz a maior das descobertas, este bichinho é diferente, este bichinho é fantástico!
       É um bichinho geográfico!
       Os meus olhos de castanhos, cheios de sonhos e histórias, aguados de horizonte, ficaram tontos, tontos, até se tornarem negros, grandes esbugalhados, tentando adivinhar os segredos que tal bichinho de conta tinha ainda pra contar, fora aqueles que sabíamos, e não íamos desvendar.
       Desceu os degraus em pedra que levavam ao quintal, e num canto da parede, forrada de “ervas-arroz”, mostrou-me entusiasmada o que a mãe natureza lá pôs.
       Um ninho!... Nem sei se ninho se chama, ao lugar onde nascem e crescem, enrolam e desenrolam, os nossos bichos-de-conta; Mas é casa... moradia, um cantinho para estar, lugar perfeito para bichos que crescem e se multiplicam, com a aragem do mar.
       E foi nessa descoberta de crianças, tão ingénua, que começou a brincadeira, do bichinho apontador das ilhas, a posição. Bastava tocar-lhe ao de leve, num jeito doce da mão, pontas dos dedos suaves, como seda e pensamentos, acariciando a mãe Conta e todos os seus rebentos.
       E foi aí que nasceu o Bichinho-Bichiel, que assim nos indicava onde era S. Miguel, e do Bichinho-Bichial que nos mostrava desenrolando onde ficava o Faial.
       Esse bicho passou a servir prás mães contarem às filhas, que nas cozinhas existia, debaixo de qualquer armário, em lugar de se esconder, um bichinho que contava as vezes que a sopa ficava, ou não, por comer.
       Se fosse sopa de letras... mil conchas de borboletas viriam povoar os nossos sonhos. Se era de feijão, ele contava grão a grão... se fosse de vegetais eram beijos e coisas tais...
       Por isso as crianças sabiam que assim sentando-se à mesa e no prato fumegava sopa, o bichinho de contar, estava lá a espreitar, e depois contava às mães, sem “emboras”, nem “poréns”, o que se comia ali.
       Muito, pouco, nada, tudo!
       Não era um bicho papão... Não!
       Mas acreditando na história, não deixava as “mães na mão”.
       Que graça tinha este bicho, que para além de “inteligente”, servia para contar histórias, que tinham lá dentro gente.
       E por mim contado ás crianças, constrói as minhas lembranças!

8 de fevereiro de 2010

Á minha conterrânea “Rosa das rimas”

Gente da minha terra:
Encontro de Terceirenses que gostam de poesia, mas sobretudo da sua ilha.
(Blog: Azoriana em http://silvarosamaria.blogs.sapo.pt/814473.html)


Numa rima de palavras
Em jeito de agradecer
Envoltas na madrugada
Letras de “bem-querer”
Obrigada pelo que escreveu
Em letras soltas
Leves, limpas
Volitando como aves
Assim é ”Rosa das rimas”
Entende bem de saudades!

Lembranças

       Pequena, pela mão de minha mãe, descia a rua do galo... íamos ás compras... irrequieta (tinha bichos carpinteiros), mas atenta, observadora; não sei quantos anos teria, mas recordo que uma das passagens, certas, era na loja de panos, perfumes avulso e outros artigos de requinte do Sr. Vidal!
       Ainda hoje sorrio ao lembrar-me que alguém, ao ser atendido, num dia em que também eu lá estava, pede a coisa mais extraordinária que na altura eu poderia ouvir...
       Ó senhô Vidral, ê cria um lencinhe, verdoso, amareloso... cumas risquinhas de riba a baixo e umas musquinhas a crê poisar! (Coitado do senhor Vidal, viu-se grego para encontrar tal lenço).
       Escangalhei-me a rir..., não fosse eu a “piquena do Chico d’Alfredo”, o que não evitou umas negras no braço, das beliscadelas da mãe.

5 de fevereiro de 2010

O Passaragatinho

       Às listas, amarelo, branco, ar dengoso, ronronando, pêlo lustroso; apareceu como por magia, numa rua de Barrelas, um gato, um estranho gato, tão lindo que até parecia pintadinho a aguarelas!
       Poderia começar esta história por:
       Era uma vez um canteiro..., era uma vez uma árvore pequena..., era uma vez um arbusto..., era uma vez um ninho, um ninho sem passarinho...
       Mas vou começar assim:
       Era uma vez uma rua, no céu havia uma lua, na rua havia um canteiro, e no canteiro uma árvore, rodeada de pedrinhas, que juntou o jardineiro.
       Na árvore, pequena mas frondosa, folharuda, havia um ninho...
       Nesse ninho o que haveria?
       Um passarinho encarnado?
       Um melro-preto pintado?
       Mas que estranha história esta, volto a traz e volto ao gato, amarelo, listado, dengoso, bem encarado... mimado.
       Quem perderia tal gato?
       A vizinhança com pena, encantada com os trejeitos do engraçado bichano, dava-lhe pratinhos de sobras, até patês e outras coisas gulosas.
       Tentavam agarrá-lo, talvez adoptá-lo, mas qual quê! Não se deixava levar em enganos.
       Comer, sim!
       Passeios e miadelas, lá ia lambendo tigelas, passando-se nas canelas, este gato era esperto, vivia ali muito bem; e poderia até pensar:
       “Como do melhor que um gato tem!
       Numa noite de invernia, até lhe fizeram “casa” num jeitoso balde de cola, lavadinho até á borda, um pedaço de cobertor quente, para não bater o dente.
       Mas não era aí a dormida!
       De onde viria ele?
       Aparecia como por encanto, e num ai, desaparecia, deixando-nos com cara de espanto.
       Por mais que vasculhássemos, procurássemos, o tentássemos iludir, ou apanhá-lo a fugir do seu misterioso esconderijo, este gato era esperto, era rijo!
       Já tinha chovido “a potes”, e ele, seco, um “nem me toques”!
       Era um frio de rachar! E lá aparecia ele, sabia-se lá de onde vinha o bichano de estar.
       Intrigada a vizinhança, tentava apanhar o dengoso, saindo do seu buraco, mas nada! Nem com a cilada montada, o pequeno gato listado se deixava apanhar.
       Mas todos os dias lá estava, à frente do prato cheio de restinhos e gulodices, que toda a gente lhe dava.
       Um dia, já muito tarde, saio do carro pra casa, e eis que se não, aos meus pés surge o nosso listadinho, amarelo, amarelinho, miando, com marradinhas nas pernas, e lá lhe dei um bocado de pão que trazia no saco, não fosse morder-me as canelas.
       Pão comido, só de um trago, ficou o listado no canteiro. Foi aí que me lembrei:
       ...E se eu me escondesse agora?... Pode ser que hoje descubra, onde é que o listado mora!
       E não é que meu dito meu feito, mal fecho a porta de casa, apago a luz, fica escuro, e lá vem o nosso gato, devagar, devagarinho, juntinho ao muro, foi-se chegando ao canteiro, pôs as patitas na árvore, arma um salto ágil, lampeiro, sobe ao tronco, pelo meio das folhinhas, dá meia dúzia de voltas, e lá no meio de toda aquela folhagem, muito bem escondidinho, não morava ave, bicho de pena, mas sim , em jeito de ninho em casa estranha de estar, é que dormia o nosso gato, este “gato-passarinho”!
       E como digo aos meninos, ao fim do conto contado, ficou o conto acabado.